Há alguns meses, estava começando uma resenha sobre o álbum de estreia de uma cantora chamada Tammi, não havia ouvido o disco antes, então não sabia o que esperar. O resultado foi decepcionante por diversos motivos, o principal deles era sua produção completamente preenchida por efeitos que estragavam todo um material que, aparentemente, era ótimo, mas foi engolida por uma tentativa de recriar a voz da cantora Zora Venka.
Depois daquela resenha, não ouvi falar sobre Tammi por um tempo, até ela lançar o primeiro single do seu novo material, a faixa "Vaqueira Cibernética", e para minha imensa felicidade e surpresa, a cantora ouviu os conselhos que lhe foram dados na primeira resenha e conseguiu mostrar todo o seu talento sem todo aquele efeito contaminando sua música.
Logo depois, a cantora lançou seu segundo álbum, o "Locomotiva", e foi aclamada pelo público logo de cara, adquiriu uma legião de fãs que estavam e estão determinados a defendê-la com unhas e dentes de todas as críticas e apoiá-la em momentos importantes da sua carreira. A curiosidade falou mais alto, principalmente depois de um lead single tão promissor, tive que ouvir o disco. E minhas impressões estão escritas nesta resenha, logo abaixo:
01. Slow West
Iniciada por um coral evangélico, "Slow West" abre o CD, mas engana-se quem pensa que a música seguirá a vibe gospel que seus primeiros segundos apresentaram. Pelo contrário, ela muda totalmente de estilo e se apresenta mais obscura do que nós conseguiríamos imaginar que seria, mesmo se pensássemos no primeiro álbum de Tammi, que também carregava uma sonoridade mais puxada para este lado alternativo. "West" fala sobre determinação, sobre alguém que nunca se dá por satisfeita com pouco e sempre está a fim de conquistar mais, mesmo que tenha que derrubar algumas pessoas para isto. A instrumental vai crescendo ao longo do tempo e é o grande destaque da faixa, já a produção surpreende por não estar recheada de efeitos, ainda que eles sejam percebidos ao fundo dos vocais, porém, desta forma, um pouco mais suaves e bem mais audíveis do que em seu último material.
02. Bang Bang Bang (ft. Sara)
A parceria com Sara traz um tom mais agressivo ao álbum, numa letra em que Tammi fala sobre sua reputação como assassina profissional. A faixa tem uma instrumental e composição bem interessantes e sua produção segue a linha da faixa anterior, sem nenhuma surpresa a adicionar. Apesar de ser uma boa faixa, não é um destaque do material.
03. Montanha-Russa
Prosseguindo, temos "Montanha-Russa", onde Tammi fala sobre ter se envolvido profundamente com um cara que gosta de brincar com sentimentos alheios e que quando ela se deu conta já estava muito envolvida. A composição desta faixa é uma das mais interessantes do material, mas acabou sendo ofuscada por uma instrumental que, infelizmente, se arrasta até o final, sem te causar nenhuma sensação enquanto a ouve. Poderia ter sido um smash hit.
04. Vaqueira Cibernética
Chegamos ao primeiro single. "Vaqueira Cibernética" é uma faixa completa: composição muito bem escrita, instrumental marcante e produção condizente com sua batida, sem quase nenhum erro. Nesta faixa, Tammi expõe seu desejo de ser livre para cometer todas as loucuras que passam pela sua cabeça, mas não encontra muitas oportunidades para fazer isso e pensa em desistir de tudo, tudo isso em seus momentos insanos na pista de dança sobre o efeito de drogas - ou não. "Noite novamente, a pista está brilhando, a música não para, tenho uma questão sem solução. Quero liberdade, liberdade, felicidade, queimar essa cidade só pra gente rir [...]".
05. Mecanismo Indispensável
Partimos para um dos destaques do álbum. "Mecanismo Indispensável" tem uma letra maravilhosa onde Tammi se põe no papel indeterminado, onde põe sua identidade à tona pela primeira vez: "Sou mulher? Sou genética?" e diz que a verdade é seu mecanismo e que ela é movida por este mecanismo. A instrumental é um ponto forte da faixa também e a produção é uma das melhores do álbum, pois é onde os efeitos vocais estão melhor encaixados atrás da voz principal.
06. Nó
"Nó" é a faixa onde Tammi se enxerga em uma situação sem escape, sufocando-se, como ela mesma diz na letra, e implora para que consiga sair deste buraco em que se encontra para que possa mostrar a todos que ela conseguiu se levantar, mesmo que quase sem esperança. Esta talvez seja a faixa mais linda do álbum, com a composição mais profunda (e, provavelmente, pessoal) de todo o álbum. Certamente, um grande destaque do material. "Não tenho religião, mas pedi em oração: não me deixe ir, preciso estar aqui, preciso ser feliz, ter alguma chance, ver o amanhecer de forma diferente. Gritar pro mundo todo que eu me levantei [...]". MASTERPIECE!
07. Maremoto
"Maremoto" é aquela faixa que você adora quando ouve pela primeira vez, mas aí quando para pra prestar atenção na letra e vê que ela se repete praticamente o tempo inteiro, acaba se decepcionando, principalmente quando a instrumental é um hino do caralho que poderia ser muito bem aproveitado. Mas a gente finge que a letra é a melhor do mundo e continua ouvindo só porque gostou da instrumental. Composição de Maremoto? Nunca critiquei!
08. Disque T Para Matar
Elevando o ritmo do álbum, temos uma das faixas mais comerciais do mesmo. "Disque T Para Matar" é muito bem produzida e tem uma instrumental que se faz presente a todo momento, sem se arrastar ou se tornar enjoativa. A produção, por sinal, é uma das melhores do álbum por conseguir controlar muito bem os seus efeitos vocais e encaixá-los apenas nos momentos certos.
09. Possessão
Como o nome já diz, esta é uma faixa onde Tammi se diz possessiva em relação a um cara e alega se sentir mal quando está distante da pessoa em questão. A repetição de estrofes da faixa acaba a tornando menos atrativa, a virada que a instrumental dá no meio do caminho também não é nem um pouco agradável.
10. Locomotiva
A faixa-título encerra o álbum e faz isso muito bem. Apesar de ser bem longa (tem quase seis minutos de duração), não se torna enjoativa em momento algum e encerra o álbum da mesma forma que ele começou e se manteve pela maior parte do seu período: obscuro. A instrumental cresce quando está quase próxima do fim, aumentando ainda mais o hype da música e não permitindo que ela se arraste até o fim dos seus 5:51 de duração.
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Há alguns meses eu estava escrevendo estas últimas linhas decepcionada. Decepcionada porque eu vi uma menina com um ponto de vista artístico lindíssimo e totalmente diferente de tudo que eu tinha visto neste RPG jogar tudo isto fora com uma tonelada de efeitos vocais que mais estragaram suas músicas do que acrescentaram. Hoje eu escrevo estas linhas orgulhosa desta menina por ela ter absorvido todas as críticas que lhe foram feitas e usado todo o seu talento para trazer um dos materiais mais promissores do ano.
Tammi conseguiu trazer uma sonoridade que é pouquíssima explorada no mundo virtual e transformá-la em sua obra de arte, onde trouxe lindas composições e mostrou toda a sua evolução como produtora. "Locomotiva" é a prova de todo o seu talento que todos nós já sabíamos que existia, mas que ficou escondido em seu disco de estreia. Mas agora ele foi totalmente exposto e eu espero, do fundo do meu coração, que ela nunca mais o esconda, porque a música virtual precisa disso, precisa MUITO.