STATIONCRITIC: Se Gabi se concentrasse em todos os seus álbuns como fez com ''ZERO'', a cara de sua discografia seria totalmente diferente.

Quando falamos de Gabi, logo lembramos de seu imenso repertório, principalmente discográfico, e vemos que, apesar de nem sempre entregar grandes obras-primas, a cantora precisou explorar várias vertentes da sua criatividade para conseguir se manter ativa depois de seis anos de carreira e mais de quinze álbuns nas costas, mas, ultimamente, isto tem sido o seu pior problema.

É muito difícil para uma artista com uma discografia tão grande conseguir se reinventar a cada álbum, pois ela pode ter a sensação de que já abusou demais da sua criatividade e cair no erro de repetir um estilo e/ou uma temática já utilizados por si mesma anteriormente, o que, no caso da veterana, nunca deu certo. 

O último grande lançamento de Gabi foi o "SKIN" de 2015, de lá para cá, seus discos "Shadows" e "Gabriela" não foram muito bem recebidos pelo público e causaram polaridade entre a crítica que se dividia entre os que amavam e odiavam ambos. O último, inclusive, trouxe uma sonoridade bem similar ao "Rich Bitch", que também causou muita polaridade do público e crítica em 2015.

Depois de receber diversas críticas negativas sobre seus dois últimos álbuns, a cantora resolveu voltar a se concentrar de verdade na produção de um disco e nos trouxe "ZERO", um álbum mais sentimental de forma que não víamos da cantora há tempos com uma sonoridade que pouco foi explorada na música virtual. É bom ver Gabi se arriscando em novos horizontes, mas, depois de seguidas decepções, é difícil ter 100% de confiança no que a cantora nos entrega.

01. Zero
O álbum é aberto pela sua faixa-título, com composição desesperançosa, esta faixa pode ser associada a "Arrependimentos", do álbum SKIN, por conta da letra onde a cantora aponta seus próprios defeitos de forma intensa, dizendo ser incapaz de mudar a forma que é e que já perdeu diversas oportunidades e pessoas graças aos seus erros, e, nesta faixa, dizendo que não encontra motivos para continuar viva, pois sabe que não terá mais nenhuma outra chance de recomeçar sua vida. "Alguém me disse que faltam sete minutos para que toda dor terminasse, apenas sete minutos para o inferno, mas eu confesso que não acreditei [...]". Não é um dos pontos altos do disco, mas é uma ótima introdução.

02. Distância
"A distância é o que nos separa por cada dia que continua passando [...]", assim é aberta a faixa, que foi o primeiro single da era. Nesta faixa, a cantora diz a uma pessoa que eles seguem estilos de vida muito distintos e que, por esta razão, não conseguem viver em harmonia e aponta os erros desta pessoa, dizendo que ela está pagando o prejuízo pelos erros que cometeu. O engraçado é que esta faixa soa como o outro lado da moeda da história da faixa anterior, o que pode ter sido apenas uma coincidência, ou algo bem pensado, caso seja a segunda opção, parabéns Gabi.

03. Sálvia (ft. Raquelusho)
Esta é a faixa mais longa do álbum, mas também é um dos grandes momentos do mesmo. O título da faixa e sua composição são muito inteligentes pois a cantora faz uso da planta Sálvia para se referir aos efeitos tranquilizantes que ela causa em quem a ingere como sendo a única alternativa que ela tem para se livrar de todos os seus problemas, pelo menos por algumas horas. A participação de Raquelusho só adiciona pontos a faixa, pois, sem seus versos e seu back vocal no refrão, talvez a faixa se tornasse repetitiva e monótona por conta de sua instrumental, o que felizmente não aconteceu. 

04. Nevoeiro
Terceiro single da era, "Nevoeiro" é aquele tipo de faixa que, individualmente, se sobressai, mas quando colocada em conjunto é esmagada pelo restante do material. Apesar de ser uma ótima faixa e de ter uma composição bem emotiva, ela é ofuscada dentro do disco, pois existem diversas faixas mais potentes e que chamam mais atenção do que ela. Entretanto, não a descartaria do disco, pois de certa forma contribui para a coesão do mesmo. 


05. Chainsaw
Chegamos a um dos momentos mais fracos do disco. "Chainsaw" é uma faixa que dificilmente daria certo, pois sua instrumental não é atraente e não é instigante o suficiente para fazer com que consigamos ouvir seus quase seis minutos de duração, e a produção da faixa também é uma das mais fracas do disco, com efeitos exagerados colocados em momentos inoportunos, numa falha tentativa de fazer a faixa grudar na cabeça. 


06. Ontem
O álbum rapidamente se recupera do tombo da faixa anterior com esta que, ao contrário da outra, não tinha como não dar certo. A instrumental de "Ontem" é marcante e se mantém bem presente durante todo o tempo e sua produção é simples na medida certa, com poucos efeitos e alguns back vocals para suprir momentos que poderiam deixar a faixa se tornar monótona. Em sua letra, Gabi diz para um homem que ele chegou tarde demais na sua vida e que não é capaz de resolver todos os seus enigmas, pois nem ela mesma sabe como fazer isto. "Você acha que é a solução para tudo, você acha que é a resolução para o meu mundo. Querido, eu acho que você precisa saber que você chegou ontem, e chegou tarde demais [...]". É um dos grandes destaques do álbum e seria uma bela escolha para single.

07. Herege
Outra grande aposta para single, "Herege" é mais uma das diversas faixas do repertório de Gabi onde ela diz duvidar da existência de Deus, mas esta talvez seja a melhor de todas elas. Em sua composição, a cantora diz que sua fé está esgotada, porém não tem certeza se é ou não ateia, mas que não compactua com os dogmas estabelecidos pela Igreja. Além da maravilhosa composição, a produção da faixa e sua instrumental não ficam para trás, casando perfeitamente entre si e criando a melhor faixa do material até o momento. 

08. Corrompida
Esta foi o quarto single da era, último a ser lançado antes do disco ser divulgado. "Corrompida" não é um dos grandes destaques do disco, mas dá para entender o porquê de ter sido escolhida como single. A instrumental é uma das mais "comerciais" do álbum comparada às outras e causaria ótimas expectativas se fosse lançada como single logo após outras faixas comerciais como "Distância" e "Além do Sol". Nesta faixa, Gabi fala sobre corrupção e que não vai se deixar ser corrompida pelo sistema, mas confessa não saber quais passos dar se não seguir a ele. É uma boa faixa, mas não se compara as anteriores.

09. Hallucination
Outro destaque do disco, em "Hallucination" Gabi fala sobre momentos em que alucina a presença de uma pessoa que não está ao seu lado naquele momento e acusa a si mesma de estar louca ou esquizofrênica. A produção da faixa pode ter sido uma das mais bem boladas de todo o disco e a sua instrumental não a deixa ficar para trás, pelo contrário. "Você gostaria de me dizer alguma coisa, eu sei, porém as palavras ficam grudadas dentro da sua garganta, e você não coloca isso para fora com medo de me fazer chorar, e como um choque de realidade, me fazer acreditar que eu estou cada vez mais louca [...]".

10. Além do Sol
Esta é a faixa mais comercial do álbum, sendo escolhida como segundo single da era justamente por esta razão. "Além do Sol" tem uma instrumental bem marcante e uma ótima composição onde a cantora fala sobre querer encontrar a sua felicidade "além do sol", pois não está conseguindo fazer isso em vida. Não é um dos grandes pontos do álbum, mas é uma ótima faixa e perfeita para encerrar o disco. 

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Depois de muito tempo sem entregar um grande trabalho, Gabi finalmente se reencontrou e se reinventou para fazer mais uma de suas obras-primas que tanto esperávamos. Numa sonoridade arriscada que pode ser vista como chata ou monótona, a cantora conseguiu driblar o que poderia ser uma grande dificuldade e usar isso a seu favor para provar, novamente, seu indiscutível talento como produtora, apesar de algumas falhas encontradas neste mesmo material.

"ZERO" não é o melhor álbum da carreira de Gabi, como supomos que seria, mas está no Top 5 da mesma, o que é grande coisa já que a cantora tem dezesseis álbuns para chamar de seus. E ele comprova a teoria de que a veterana é capaz de fazer ótimos álbuns quando se esforça de verdade na produção dos mesmos e se preocupa em trazer outras vertentes da sua criatividade, ao invés de cair na sua própria mesmice e se acomodar em gêneros que sequer deram certo da primeira vez, quiçá numa segunda. Bem-vinda de volta, vovó do Pornopop.